2010-02-12

Fame

Hoje fui entrevistado e fotografado para a newsletter mensal do meu local de trabalho, uma decisão que não deixou de me surpreender visto que toda a gente sabe que eu nunca tenho nada de simpático para dizer, e ninguém mais que os Recursos Humanos - os responsáveis pela newsletter - sabe melhor disso, uma vez que a quantidade de queixas formais contra mim é tal que até já têm um armário só para os meus processos. Acho que já só preciso de mais quatro para poder trocar por uma Bimby.

Nesta entrevista faço revelações chocantes - o tipo de revelações de que as paródias porno são feitas, por isso o gordo do armazém e a velha da contabilidade que se cuidem - e lanço farpas em todas as direcções. A pessoa que me entrevistou chamou-lhes perdigotos, e que um levava um nico de carne picada das almôndegas do almoço que lhe entrou para o olho e mais não sei o quê, mas eram farpas.

A parte mais difícil foi a fotografia porque ela queria que eu sorrisse e eu, de tão desabituado que estou, acabei por fazer uma distenção muscular facial. A fotografia escolhida virá nas páginas centrais em formato de poster e, caso estejam interessados, no mês que vem farei uma sessão de autógrafos junto à casa de banho do segundo piso.

Porquê ??



Terça-feira é Carnaval. Tirando o facto de ser feriado, não consigo encontrar nada de bom neste período. Na parte que me toca, está para as festividades como os ovos mexidos com mioleira para a culinária.
Entre hoje e a próxima terça, os noticiários vão ser compostos por reportagens de tudo quanto é desfile carnavalesco realizado em Ovar, Loulé, Torres Vedras, Loures e Madeira. E a depressão será inevitável.
Quero com isto dizer que os meus olhos serão agraciados com brasileiras série B, mostrando ao mundo os seus 95 quilos, a dançar em trajes menores como se estivessem no Rio. Mas não estão. E isso é um facto.
Não estão porque a temperatura não passará dos 10 graus. Não estão porque o nível de precipitação será elevado. Não estão porque é amplamente notório que ali há pneumonia à espreita. Daquelas fortinhas, garantido às meninas uma longa estada numa qualquer unidade hospitalar. Vendo a situação pelo lado positivo, pode ser que emagreçam.
Como se este panorama não fosse suficientemente assustador, as imagens das brasileiras obesas, à beira de entrarem em estado de hipotermia, serão intercaladas por foliões portugueses vestidos de mulher. Terrível.
Não dá para compreender a paixão desses homens por se mascararem de elementos do sexo feminino. Pequena mala na mão, ao bom estilo da Rainha Isabel II de Inglaterra. Salto alto, obviamente. Muito maquilhagem.
E com barba por fazer e muito pêlo na perna, como se quisessem afirmar: "Atenção... somos muito machos! Só estamos aqui para nos divertir. É Carnaval!!". Pois. Claro. Naturalmente. Deve haver uma explicação, mas prefiro não pensar muito nisso para não ficar ainda mais horrorizado.
Como cereja no topo do bolo, terei de lidar com as manifestações de criancinhas mascaradas. Uma verdadeira invasão de clones de figuras como o Homem-Aranha... D'Artagnan... Bob, o Construtor... Noddy... Zorro... Bela Adormecida... Fada.
Clones que, para orgulho dos respectivos progenitores, envergarão fatinhos compostos por tecidos 100% poliéster. Daqueles que reflectem a luz mesmo quando a escuridão é total. Daqueles que trazem imediatamente à cabeça a frase: "Ui! Ali há desconforto! Ali há alergia à espreita!".
E sim... detesto samba. Maça-me até à medula. Nem o Carnaval do Rio consigo suportar. Portanto, é comer e calar. Aguentar e esperar que passe. Não há volta a dar à situação.
Não consigo arranjar uma única razão para a existência do Carnaval.

2010-02-11

Tough love

O Sr. Matias sempre foi um pai severo, e aquela seria a última vez que o Luisinho faria xixi na cama. Foi também a última vez que o Luisinho teve duas orelhas.

2010-02-10

Pouca terra

Quando andava na escola primária era sempre o último a acabar os ditados, mas isso era porque o meu lápis era a carvão.

Yo

Agora que estou mal disposto começo a desconfiar que o iogurte que comi hoje de manhã, quando saiu da fábrica, não tinha pedaços.

O copo está sempre meio vazio


Então? Temos florzinhas de estufa, é? Estamos atrás do Uganda, pessoal. O meu tio deu o fígado por esta causa, não deixem o seu sonho morrer!

E se forem confrontados com mariquinhas de desculpas esfarrapadas que se recusam a fazer a sua parte não se deixem levar. Deixo-vos aqui alguns dos artifícios mais comuns dessa corja, bem como a forma de lidar com eles:

"Ah, eu não posso beber porque sou alcoólico."
"Isso nem sequer faz sentido, pá."

"Não posso beber porque estou em horário laboral."
"Tu já és tão incompetente que se estiveres bêbedo ninguém dá por nada, desde que não vomites em cima da secretária. Nem em cima da mesa."

"Eu não bebo porque vou conduzir."
"E há melhor maneira de enfrentar o stresse do trânsito que com uma garrafa de tinto no bucho?"

"Eu não posho bebêre puque shó tenho chinco anosh."
"Deixa-te de mariquices e emborca a Guiness que te pus na lancheira, que é como se fosse leite com Nesquick."

Equinidades

Ainda não descobri se a minha vizinha de cima calça sapatos de salto alto mal sai da cama ou se tem um pónei em casa que todas as manhãs galopa da cozinha para o quarto e vice versa. Esta madrugada acho que ouvi relinchar, mas isso não quer dizer nada, porque se há as que, nos momentos de intimidade, imitam chihuahuas, as devotas religiosas que invocam o nome do Senhor e as que aproveitam para ler livros do Dan Brown, então também pode haver quem relinche.

2010-02-08

Domo arigato, Mr. Roboto

Em breve as pessoas esquisitas poderão ser ainda mais esquisitas. Isto porque estará à sua disposição, pela módica quantia de 7.000 dólares, o primeiro robô sexual, que preencherá o nicho de mercado correspondente aos tarados sexuais fãs do Star Wars que sempre quiseram fazer amor não com a Princesa Leia mas com o C3PO, e aos apaixonados pela robótica que sentiam algo de estranho e excitante nas calças quando viam a Vicki da série Small Wonder.

Como meter a pila numa máquina me parece ser uma excelente ideia e não antevejo absolutamente nada que possa correr mal com isso, e já que ela fala e tudo - e esta é uma característica que eu aprecio sobremaneira, pois se alguém compra um robô sexual é precisamente pela conversa estimulante que ele proporciona -, a minha pergunta é só uma: dá para programá-la para dizer, durante o amor, em tom monocórdico, enquanto lima as unhas, "oh sim, oh sim, oh que me descadeiras"? Se sim, alguém me empresta 6.900 dólares?

2010-02-04

Vozes

Tantas vezes vi o meu vizinho a falar sozinho que assumi que tinha esquizofrenia. Afinal o que ele tem é Bluetooth - não confundir com dente azul, que isso é o que aquele senhor da gasolineira tem devido ao que eu imagino ser uma precária higiene bucal.

2010-02-03

Alcoólicos pouco anónimos

Eu vivo a minha vida de acordo com dois princípios básicos: 1) a crença de que o Pulp Fiction é um manual de instruções para a vida e 2) sair do supermercado quando o número de clientes que falam sozinhos é igual ou superior a um.

Por isso, ontem, quando apareceu um indivíduo resmungando "ai a minha vida", "fooooooda-se" e "[qualquer coisa, qualquer coisa] material" achei que devia fazer o mesmo que faço quando apanho a Anatomia de Grey na televisão e sair dali o mais depressa possível.

Pior a emenda que o soneto.

O homem veio colocar-se atrás de mim na fila para a caixa, pousou as três garrafas de vinho que trazia nas mãos e começou a tirar dos bolsos aquilo que eram, com certeza, algumas dezenas de moedas. Numa sucessão de acontecimentos que qualquer pessoa que não se baba quando diz "pechisbeque" anteviu a léguas de distância, uma boa parte delas acabou por cair levando o homem a colocar-se de rabo para o ar, com a cara colada ao chão, de modo a resgatá-las enquanto exclamava coisas que rimavam com "trabalhos ma podam" e "lona da tia". De novo de pé, já eu pagava uma quantidade anormal de comida pouco saudável - num esforço subtil de indicar à moça que sou solteiro e que não vivo com a minha mãe -, grita à rapariga da caixa, de forma desnecessariamente alta, visto que estava a menos de um metro dela, "Ó vizinha, se encontrar uma moeda de cinquenta cêntimos é minha!" "Agora só quando fechar e varrer", lamentou ela. "Pshóóó... a moeda de cinquenta cêntimos é minha! Não é preciso ser agora, mas é minha. Eu amanhã venho cá."

Dado que aquela última frase soou mais a ameaça que a encontro marcado, ou a rapariga encontra a moeda ou só a volto a ver na capa d'O Crime.

Pum





2010-02-01

Das minhas mãos distribuo a embriaguês, a estupefacção, o esquecimento, gozo e tormento dos corpos

Fico sempre surpreendido - e desconfiado - quando testemunho manifestações de afecto para com a minha pessoa. Acho que é a adolescente que nunca teve um pónei e que sabe que nunca será o filho que o pai desejou que há em mim. Por isso a minha reacção imediata foi perguntar a mim próprio que razão teriam aquelas pessoas para encenar aquela mascarada e me abraçar e parecer genuinamente contentes por me voltar a ver. Discretamente levei a mão à nádega, não só porque tenho um rabo jeitoso e aprecio acariciar-me em público, mas também para verificar se não me tinham roubado a carteira no meio dos insuspeitos cumprimentos. "Aha!", exclamei para comigo, "Os sacanas gamaram-me!" Tirava já a navalha que habitualmente transporto na meia, pelo fio da qual faço justiça, Casal Ventoso style, quando me lembrei que não uso carteira desde que perdi a minha Dunas azul nas férias da Páscoa do nono ano.

Passei o resto da tarde como um escuteiro - e com isso quero dizer que me mantive sempre alerta, e não que estive a ser molestado por um adulto de calções que gosta de levar criancinhas para o meio do mato - mas não consegui descortinar qual era plano daquela gente.

Não obstante o meu estado de sobreaviso, aproveitei cada abraço feminino para apertar contra mim uma miríade de seios, de generosidade e firmeza variada, catalogando-os e classificando-os mentalmente - a minha lista acabou, curiosamente, com um número ímpar, mas quando quis fazer uma recontagem já tinham chamado um senhor simpático da Securitas -, e para lançar algumas propostas indecorosas às ex-colegas e, às que nunca o foram, outras que simplesmente ofenderiam a integridade moral do próprio Calígula, e que complementava sempre com um "estou a brincar... a menos que queiras."

No fim acabei por não perceber qual era a jogada. Talvez pretendessem atrair-me para uma sala escura para me drogar e roubar os rins, os pulmões ou uma ou outra membrana mucosa, não sei. O que sei é que quem se tramou foram eles porque não levaram nada e eu comi-lhes para aí dois quilos de brownies. Otários.