2004-11-16

A menina dança?

Se é verdade que nunca foi o meu sonho de criança exercer a profissão que tenho hoje, também é verdade que há escolhas mais estranhas que a minha. Por exemplo, o que é que leva uma pessoa a enveredar pela carreira de traficante de órgãos? O pagamento se calhar até é bom (não sei quanto está a valer um rim no mercado negro) mas em termos de realização profissional deve deixar algo a desejar, não devem ter seguro de saúde e o stress deve ser bastante. E não me parece que seja um bom tópico de conversa nas festas, entre um e outro martini.
"O que é que você faz?"
"Trafico órgãos humanos."
"Desculpe?..."
"Trafico órgãos humanos. A minha amiga prostituta atrai os homens para um quarto de hotel e põe-nos inconscientes, eu abro-os como se fossem porcos em dia de matança, saco-lhes uns orgãos e deixo-os numa poça do seu próprio sangue com um penso rápido e um cartão de agradecimento. Adoro esta música... a menina dança?"
É que, ao contrário desta, há outras actividades ilegais com um certo glamour, como ladrão de jóias ou de arte. As mulheres pensam logo no Pierce Brosnan ou no Sean Connery e já é meio caminho andado, mas nesta linha de trabalho deve ser difícil convencer alguém a dormir connosco porque elas nunca sabem quando é que vão acordar dentro de uma banheira cheia de gelo ou, muito simplesmente, abrir o frigorífico e encontrar um tupperware com um fígado lá dentro ao lado do frasco da maionese.
E deixem-me dizer, desde já, que se alguma dessas redes de tráfico de órgãos alguma vez me quiser roubar alguma coisa, basta aliciarem-me com comida. Não são precisas mulheres fatais, apenas um eclair ou um travesseiro.
"Ó jovem, anda ali atrás àquele barracão escuro connosco."
"Nããã... Eu não vos conheço de lado nenhum e vocês, com essas batas ensanguentadas e esses bisturis, têm um ar suspeito."
"Mas há lá bolos."
"Ah, então está bem."
A sério, sejam compinchas, não mandem uma jovem para me seduzir. Já basta ficar sem um órgão vital, não é preciso destruirem-me a auto estima também. Sim, porque o meu primeiro pensamento numa situação dessas seria "Homessa, a minha performance foi assim tão má que ela sentiu necessidade de me esventrar?". Não é que nunca me tenha acontecido, mas é sempre chato.